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Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS

Adalton Fonseca, Gustavo Matta, Denise Pimenta, Mariana Sebastião, Raiza Tourinho

O Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS (ABIA) (ou ABIA)) é uma organização não governamental de 36 anos com sede no Rio de Janeiro, Brasil. Seu trabalho está focado em pesquisas e advocacia interdisciplinares e participativas relacionadas à política, tratamento e prevenção do HIV/AIDS e à saúde e aos direitos humanos de forma mais ampla. A ABIA foi criada durante o processo de democratização no Brasil na década de 1980. Seu trabalho com movimentos LGBTQIA+, antirracistas e feministas influenciou diretamente os processos políticos brasileiros em torno das políticas e do tratamento do HIV/AIDS e moldou a resposta global ao HIV. Em todo o seu trabalho, as atividades da ABIA são estruturadas em torno de uma abordagem democrática e participativa que centra os direitos humanos e a equidade sexual, racial e de gênero.

Abordagem para transferir o poder para as comunidades e promover o intercâmbio equitativo de conhecimento

As principais influências teóricas da organização estão enraizadas nas práticas pedagógicas de Paulo Freire e derivam do conceito latino-americano de Saúde Coletiva. Na tradição freiriana, a educação é entendida como um processo social e político que transforma estudantes de receptores passivos de conhecimento em atores ativos capazes de compreender criticamente seus contextos e estruturas de opressão e agir para mudá-los. Saúde coletiva é um movimento epistemológico e político em defesa do direito à saúde, que tem como elemento central a interdisciplinaridade de conhecimentos, práticas e políticas. O novo campo promove o diálogo entre epidemiologia, ciências sociais e humanas e políticas e planejamento. A Saúde Coletiva operacionaliza a participação social como uma ferramenta fundamental na pesquisa em saúde e no sistema de saúde.

Como refletiu um dos líderes da ABIA:

“A ABIA sempre investiu fortemente na produção de conhecimento. Sempre acreditamos que o conhecimento não é gerado apenas nas universidades. É gerado na linha de frente, no ativismo e na mobilização política. Depende de qual é o seu propósito. Se seu objetivo é ativismo, pressão política, mobilização da sociedade, a produção de conhecimento em um espaço como a ABIA pode ser ainda mais estratégica. O que é produzido na academia é importante, mas é mais um pano de fundo, fornecendo a base para a ação política, mas não conforme impulsionado pelo propósito de mobilização política.”

A ABIA trabalha com diferentes grupos sociais afetados pelo HIV/AIDS em três áreas estratégicas: advocacia, pesquisa e educação. Seus parceiros incluem movimentos LGBTQIA+, redes de jovens, movimentos de mulheres, movimentos negros e antirracistas e (mais recentemente) movimentos sociais ligados às mudanças climáticas. Como uma instituição com uma abordagem profundamente democrática, a ABIA envolve a sociedade civil e as comunidades desde o início da pesquisa ou da concepção do projeto, identificando necessidades críticas e estratégias para dialogar com diferentes atores-chave.

Sucessos, desafios e lições aprendidas por meio do engajamento de comunidades

O maior sucesso da ABIA tem sido sua capacidade de se engajar em um diálogo intersetorial significativo e influente, envolvendo movimentos sociais, cientistas, intelectuais, profissionais de saúde, o sistema judicial, representantes do governo, políticos progressistas e financiadores, para abordar questões sociais e de saúde urgentes. Ao facilitar diálogos abertos e honestos entre diversos atores, a organização conseguiu avançar em direção ao aprendizado colaborativo e à mudança.

O grande desafio atual que a organização enfrenta está ligado à realidade de que o HIV/AIDS saiu da agenda política no Brasil, em grande parte devido ao surgimento da extrema direita na política brasileira e ao reduzido investimento global na resposta ao HIV, particularmente desde a pandemia da COVID-19.

Nesse contexto, a sobrevivência da ABIA tornou-se dependente de doações internacionais de financiadores mais progressistas, que podem ver a interconexão entre a defesa de sistemas e estruturas que garantem a saúde coletiva e uma democracia saudável. Tirando lições de sua longa experiência, a liderança da ABIA considera que, para permanecer relevante e impactante, precisa ser capaz de se adaptar a diferentes contextos políticos e sociais e adotar uma abordagem interseccional, incluindo diferentes públicos, especialmente populações vulneráveis, nas discussões sobre saúde, democracia e direitos humanos.

Caminhos para a mudança

Por 30 anos, a ABIA contribuiu para mudar o ambiente científico, político e cultural relacionado à prevenção, tratamento e proteção social do HIV/AIDS no Brasil. Muitas dessas contribuições não são visíveis ou quantificáveis, pois envolvem conscientização e redução do estigma. No entanto, muitas leis e iniciativas brasileiras — e até mesmo a Constituição — foram decisivamente influenciadas pelo trabalho da ABIA. Isso inclui:

  • Proibição da comercialização e controle de sangue e seus derivados: Até a década de 1980, o sangue era comercializado por empresas privadas e não havia controle público regular de qualidade e tratamento para evitar infecções por transfusão de sangue. Com base em pesquisas conduzidas pela ABIA, uma importante nova regulamentação foi inserida na Constituição Federal Brasileira de 1988 para proibir a venda de sangue e proteger os interesses públicos.

  • Introdução de nova legislação sobre a adesão ao tratamento do HIV: Uma pesquisa conduzida pela ABIA como parte do Projeto de Adesão examinou a relação entre a adesão às terapias combinadas e o comportamento sexual mais seguro e descreveu o impacto dessas terapias na vida das pessoas que vivem com HIV/AIDS. As descobertas moldaram as principais disposições da Declaração dos Direitos Fundamentais das Pessoas Portadores do Vírus da AIDS.

  • Introdução de uma nova lei para permitir a produção de medicamentos antirretrovirais genéricos: os esforços de pesquisa e advocacia da ABIA impulsionaram o governo brasileiro a, primeiro, quebrar a patente do medicamento antirretroviral Efavirenz e depois formalizar a Lei de Medicamentos Genéricos em 1999.

O modelo organizacional da ABIA para participação e engajamento da comunidade, baseado em um compromisso fundamental com a democracia e os direitos humanos, tem muito a ensinar a outras organizações de pesquisa em saúde sobre como centrar a participação social na prática.

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